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terça-feira, 28 de maio de 2019

Sophia- a biografia de Isabel Nery

Sophia de Mello Breyner Andresen (Porto, 6 de novembro de 1919 - Lisboa, 2 de julho de 2004) nasceu no seio de uma família aristocrática. Com o avô materno Thomaz de Mello Breyner (1866- 1933) médico da família real e 4º Conde de Mafra, Sophia aprendeu a recitar de cor mesmo antes de saber ler.
Como a autora, Isabel Nery, nunca conheceu Sophia pessoalmente, visitar todos os locais por onde a escritora passou tornou-se um dever, que a ocupou antes de começar a escrever o livro. Do Porto, onde Sophia nasceu, passando pelo bairro da Graça em Lisboa (onde Sophia viveu na Travessa das Mónicas, 57), cujo miradouro foi rebatizado em sua honra; a Praia da Granja, onde passava o verão na infância e juventude; Lagos onde tinha as férias com os filhos (os banhos de mar, as grutas, o mercado) ou até mesmo a pequena ilha de Föhr, no mar do Norte para descobrir o bisavô paterno Andresen, dinamarquês, que veio para Portugal no século XIX. 
A Grécia surge frequentemente nos poemas de Sophia com o nome de lugares visitados, figuras históricas e mitológicas. Sophia esteve na Grécia em 1963 e, em 1986, fez parte da comitiva presidencial na visita do Presidente Mário Soares à República Helénica. Foi outro dos locais visitados por Isabel Nery antes de escrever a biografia- tentar talvez explicar o que levou a poeta ao fascinio pela civilização grega, a união perfeita entre os deuses e a natureza... é estranho mas a obra de Sophia nunca foi traduzida para grego...

O mar é outro elemento simbólico de grande importância em toda a obra poética de Sophia de Mello Breyner Andresen.

A Praia da Granja despertou-lhe a paixão pelo mar. Situa-se no concelho de Vila Nova de Gaia, distrito do Porto.
Teve origem no lugar da Granja, freguesia de São Félix da Marinha, com a construção de uma quinta, em 1758, denominada a Quinta da Granja, mais tarde Quinta dos Ayres e hoje conhecida por Quinta do Bispo. Pertencia aos frades crúzios do Mosteiro de Grijó, que a utilizavam como estância de convalescência e repouso. Tornou-se moda a aristocracia portuguesa passar os verões na Granja.



"De todos os cantos do mundo
Amo com um amor mais forte e mais profundo
Aquela praia extasiada e nua
Onde me uni ao mar, ao vento e à lua.
Há muito que deixei aquela praia
De grandes areais e grandes vagas
Mas sou eu ainda quem na brisa respira
E é por mim que espera cintilando a maré vasa".

Sophia de Mello Breyner Andresen





Praia de Lagos 






«Quando morrer voltarei para buscar os instantes que não vivi junto do mar»

Sophia de Mello Breyner Andresen


É difícil ficar indiferente ao esplendor da Casa Andresen, anteriormente denominada Quinta do Campo Alegre 
Passou para as mãos da família Andresen em 1895, quando o avô de Sophia de Mello Breyner a adquiriu a um brasileiro. A partir daí Joana e João Henrique Andresen iniciaram trabalhos para enaltecerem o espaço. Foram eles que terminaram a renovação da casa e dos jardins.

Foi aqui que Sophia nasceu e cresceu, num ambiente católico e culturalmente privilegiado, a brincar livremente pelos jardins na companhia do, também escritor, Ruben A. A influência da casa pode ser lida em muitas das suas obras. È onde  fica o Jardim do Rapaz de Bronze, uma das mais conhecidas obras de Sophia de Mello Breyner. "A vida social era intensa na Casa Andresen, sendo frequente a presença de escritores, pintores e músicos, além dos homens de negócios. mas a maior festa do Campo Alegre era o Natal, permanecendo toda a vida a época favorita de Sophia" (pag 61)

Mudou-se para Lisboa, em 1937, para frequentar a Universidade de Lisboa (a Faculdade de Letras do Porto tinha sido encerrada durante a ditadura militar, em 1928) e começou a viver em casa dos tios no Campo Grande. No entanto, abandona o curso logo no ano seguinte e, sete anos depois, lança o primeiro livro Poesia. Em 1946, casa com o advogado Francisco Sousa Tavares (1920-1993) com quem teve cinco filhos, que a motivaram a escrever contos infantis.

Influenciada pelo marido, inicia a actividade contra o regime de Salazar. Ficou para a história este seu poema cantado por Francisco Fanhais:                                                                                                                                                       
Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar
Vemos, ouvimos e lemos
Não podemos ignorar

Vemos, ouvimos e lemos
Relatórios da fome
O caminho da injustiça
A linguagem do terror


A bomba de Hiroshima
Vergonha de nós todos
Reduziu a cinzas
A carne das crianças

DÁfrica e Vietname
Sobe a lamentação
Dos povos destruídos
Dos povos destroçados

Nada pode apagar
O concerto dos gritos
O nosso tempo é
Pecado organizado.

Depois do 25 de Abril, chegou a ser deputada, o que para a poeta era "uma agonia". Mário Soares convidou-a para ser Embaixadora em Paris, mas Sophia recusou. Em entrevista à RTP, em 1977, reconheceu "A realidade não cumpriu aquilo que eu esperava. A poesia estava na rua, mas tinha sido rapidamente empurrada para dentro de casa" (pag 207)

O casamento trouxe a Sophia muitos dissabores: a falta de dinheiro quando o marido foi preso (os filhos foram  viver com familiares que tinham possibilidades para cuidar deles, como escreve Miguel Sousa Tavares no "Cebola Crua com Sal e Broa"), o vicio do marido em jogar bridge a dinheiro e as infidelidades, levaram ao divórcio litigioso de Francisco Sousa Tavares e Sophia de Mello Breyner Andresen, em 1986.

Não devia ser fácil lidar com Sophia: os humores, ironias e estilo de vida desorganizado. Como dizia  a criada Luisa "Se não fosse eu comia-se poesia cá em casa" O seu ar um pouco altivo deve ter afastado o aparecimento de uma biografia da poeta, considerada uma das mais importantes escritoras portuguesas do século XX. Mas veio a tempo... a biografia de Isabel Nery, que se publicou este mês vem celebrar os 100 anos do nascimento de Sophia de Mello Breyner, que muito admiro, como já tive ocasião de manifestar noutro post. Estou agradecida por ter aprendido coisas novas, que provam que a marca de Sophia ficou para a história da literatura portuguesa.



Filme Sophia de Mello Breyner Andresen de J. César Monteiro, 1970


Nery, Isabel. SOPHIA de Mello Breyner Andresen. Biografia. A esfera dos livros. 1º edição. maio 2019.






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