As palavras
São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.
Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam:
barcos ou beijos,
as águas estremecem.
Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.
Quem as escuta? Quem
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?
Eugénio de Andrade
Nestas minhas andanças pelo estrangeiro tenho ouvido muitas história de segregação das crianças que falavam português na escola. Eram alvo de bullying ou gozadas. Daí os pais de alguns deles, certamente pouco instruídos, tivessem abandonado a sua própria língua materna nas conversas com os filhos para utilizarem a língua inglesa ou castelhana ou outra qualquer, conforme os países para onde emigraram. Eles próprios precisavam de praticar os idiomas desses países e muitos nunca conseguiram tornar-se fluentes, porque não quiseram ou tiveram a oportunidade de as aprender de maneira correta.
Quando vivi nos EUA ouvi essas histórias relativamente ao inglês e lembro-me perfeitamente de estar numa loja, que fazia molduras e a senhora vir com esse mesmo conto, que oiço em todo o lado: os portugueses valorizam muito a família, são muito trabalhadores e não se metem em problemas. Isto para mim não basta. Aliás, nas minhas estadias ao longo destes anos quer na América do Norte quer na do Sul, fiquei com a ideia que a emigração portuguesa nada ter de original em comparação com os outros povos europeus, sejam eles originais do norte ou sul da Europa.
Às vezes vinham mais uns comentários como este: "quanto à língua é que tiveram problemas, apesar de estarem a viver no país há tantos anos, não conseguem comunicar bem ". Eu devia estar nos dias com pouca pachorra e disse-lhe, apontando para um anúncio da loja em frente: "bem parece que não são só os portugueses. Aqui escreve-se muito mal inglês. Por acaso aquela loja é de portugueses? Sabe o plural das palavras nunca é feito com um apóstrofo...". E dei-lhe uma lição breve de gramática... Não me recordo do seu comentário, contudo, suponho, percebeu que comigo aquela conversa do "coitadinho" não pegava...
As festas da comunidade para as quais era convidada aos fins de semana mostravam um Portugal, que eu felizmente não conheci, apesar de grande parte das pessoas ter a minha idade ou pouco mais velhas. Recordo-me de um teatro em que as pessoas cantavam alegremente a lavar a roupa num tanque supostamente da aldeia... Sou do tempo antes da máquina de lavar, porém estas cenas só conhecia do cinema português antigo...bem, até é possível existirem ainda algumas raridades, quando muita da gente portuguesa emigrou...
Também uma senhora de origem irlandesa, da qual fiquei muito amiga, teve uma vez o descaramento de dizer que o seu apelido português era proveniente de um antepassado do marido, cujas origens eram holandesas e não dos Açores, de onde era a maior parte dos emigrantes portugueses daquela região. Na ocasião fiz uma pequena pesquisa. Foi então uma novidade para mim constatar que no século XV, a pedido do Infante D. Henrique, a irmã D. Isabel de Portugal, Duquesa da Borgonha, incentivara a ida de alguns flamengos para os Açores (a população portuguesa era escassa para dois arquipélagos e tanta ilha). Portanto essa realidade remontava há quase quinhentos anos e tinham sido poucos os flamengos a estabelecer-se nos Açores; além do mais uma pessoa ou família com determinado apelido podia tê-lo adotado por variadíssimas razões. Também bastantes emigrantes europeus que colonizaram, sobretudo, as Américas, África e a Austrália eram degredados cumprindo penas...as autoridades portuguesas como todas as europeias seguiram esse método, até ao século XX.
Há algum tempo, recebi um grupo simpático de senhoras de origem portuguesa. Todas com estudos superiores. Fizeram os mesmos comentários de terem tido dificuldade em aprender português, pois em casa tinham de praticar o melhor que podiam o castelhano para não serem alvo de bullying na escola. Agora, querem que os netos e jovens aprendam português. A propósito, disseram-me que já tinham ido falar com o coordenador dos estudos portugueses da embaixada de Portugal, o qual tem feito um ótimo trabalho. Sente-se assim que o Português e Portugal estão na moda. Talvez porque, aparentemente, somos um país moderno e quando o visitam as pessoas sentem orgulho na sua terra de origem.
Ainda a propósito de esteriótipos tontos. Lembro-me que no ano passado no cabeleireiro ouvi uma senhora local a contar uma história qualquer à cabeleireira. Atraiu-me a atenção, quando a ouvi falar dos portugueses. Estava a referir-se a alguém que tinha umas "pernas portuguesas". Fiquei intrigada, mas não interrompi. Na primeira oportunidade perguntei a uma senhora venezuelana, que tenho confiança, o que era aquilo das "pernas portuguesas". Fiquei então a saber que a expressão se refere a pernas mal feitas e sobretudo muito gordas. Fiquei impressionada por essa ideia...na minha família somos todas portuguesas e ninguém tem esse tipo de pernas...
Este país pode ser conhecido por ter tido muitas mulheres a ganhar prémios de beleza; porém, quando vamos à praia, ou ao cinema, o que encontramos é uma grande maioria de gente feia e obesa...como nos outros países da América do Sul e do Norte.
Voltando à visita e à conversa com aquelas senhoras: é de louvar o objetivo de promover o ensino e a aprendizagem da Língua Portuguesa. Realmente o Português é dos idiomas mais falados no mundo. Pode ser sempre útil. Em qualquer estatística geral aparece como a quinta língua em termos de utilizadores.
Tal como o inglês e o castelhano, o português é das línguas mais dispersas. Trata-se de uma língua oficial em cinco continentes: Europa, África, América, Oceania e Ásia. Por isso não me surpreendeu ver nos confins da Guiné-Bissau este cartaz...
O alemão é a língua mais falada na Europa, porque a Alemanha é o país com maior número de habitantes e, vá lá a Austria, o Liechtenstein, Luxemburgo e parte da Suiça dão uma ajudazinha para aumentar a estatística. No entanto, fora daquele continente não tem expressão.
O francês, outrora considerado a língua diplomática, tem vindo a perder o estatuto e a prova disso é o seu ensino nas escolas em Portugal. No meu tempo, não havia opção, era a primeira língua estrangeira que se aprendia. Todavia, hoje em dia, está longe de ser a primeira escolha dos alunos. E reduziu-se significativamente a própria influência cultural francesa. Algo não muito positivo, porque existe, na minha opinião, uma excessiva hegemonia da cultura anglo-saxónica, na maior parte das vezes uma forma de não se dizer "americana".
Desde a nossa entrada na CEE, hoje UE, o Português tem ganho cada vez mais proeminência, sendo uma das línguas oficiais das instituições europeias. Os emigrantes que visitam Portugal, já não vêm o seu país de origem apenas como um parente pobre, mas sim como um que rivaliza com os demais, até na organização de eventos mundiais, como foi a Expo 98 ou o Campeonato da Europa de Futebol 2004 (teria passado bem sem eles e o seu elevado custo, mas lá que foram um sucesso, foram). Ainda a propósito daquele primeiro evento lembro-me do Mayor de New Bedford ter afirmado, que esperava encontrar um país com muitas mulheres vestidas de preto e lenço na cabeça e ficou muito supreendido e entusiasmado com a realidade portuguesa que deparou em 1998...
Com o Secretário-Geral António Guterres na ONU, espero que o Português se torne língua oficial daquela organização. Já não será sem tempo.
E por tudo isto decidi que, a partir deste ano, o meu blogue será quase só em Português...
Boa, Teresa! E assim mesmo. O Portugues,,sempre!
ResponderEliminarE as venezuelanas que ganharam os concursos de beleza fizeram nao sei quantas plasticas para ficarem assim porque os autoctones nao tem aquelas feiçoes!
Olá Teresa, beli texto e boa degesa da língua portuguesa. Espero que o português seja cada vez mais falado e escrito. Belo poema de Eugenio de Andrade um dos poetas preferids do meu marido.
ResponderEliminarSim prima, completamente de acordo contigo. Gostei muito.
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